segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Urinary Sodium and Potassium Excretion, Mortality, and Cardiovascular Events

Martin O’Donnell, Andrew Mente, Sumathy Rangarajan, Matthew J. McQueen, Xingyu Wang, Lisheng Liu, Hou Yan, Shun Fu Lee, Prem Mony, Anitha Devanath, Annika Rosengren, Patricio Lopez-Jaramillo, Rafael Diaz, Alvaro Avezum, Fernando Lanas, Khalid Yusoff, Romaina Iqbal, Rafal Ilow, Noushin MohammadifardSadi Gulec, Afzal Hussein Yusufali, Lanthe Kruger, Rita Yusuf, Jephat Chifamba, M.Phil., Conrad Kabali, Gilles Dagenais, Scott A. Lear, Koon Teo, M.B, and Salim Yusuf, for the PURE Investigators

N Engl J Med 2014, 371(7):612-23.

            O estudo PURE (Prospective Urban Rural Epidemiology) é uma coorte epidemiológica realizada em 17 países, reunindo mais de 156 mil pessoas entre 35 a 70 anos para avaliar a relação entre consumo de sal e mortalidade. Foi coletada amostra de urina de todos os participantes e utilizada a fórmula de Kawasaki para estimar a excreção de sódio urinário de 24h. Para este braço do estudo, 101.495 participantes, sendo 42% deles chineses, foram acompanhados por uma média de 3,7 anos. O desfecho primário (morte e evento cardiovascular maior) ocorreu em 3.317 participantes (3,3%): 1.976 pacientes morreram (sendo 650 por causas cardiovasculares), 857 tiveram infarto do miocárdio, 872 acidente vascular cerebral e 261 desenvolveram insuficiência cardíaca. Ao comparar a excreção urinária estimada de sódio de referência (4 a 5,9 g/dia), os pacientes com excreção de sódio acima de 7g por dia, apresentaram maior risco do desfecho primário (OR 1,15 com IC95% 1,02 a 1,30). Um aumento no risco de desenvolver desfecho também foi encontrado naqueles pacientes com menor excreção de sódio (<3g/dia), com OR 1,27 (IC95% 1,12 a 1,44). Além disso, excreção reduzida de potássio (<1,5g/dia) esteve associada a aumento de risco do desfecho primário. Durante o clube foram levantados os seguintes pontos:
·         O estudo tem como ponto forte o grande número de pacientes avaliados em diversas regiões do mundo, porém uma importante parcela da amostra era constituída por chineses;
·         A fórmula utilizada para estimar a excreção urinária de sódio e potássio de 24 horas a partir de amostra de urina, apesar de apresentar limitações, foi validada previamente;
·         A curva em J entre a excreção de Na/K e o desfecho de interesse poderia ser explicada pela ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona em pacientes que ingerem menos de 3g de sódio por dia;
·         Há possibilidade de causalidade reversa: pacientes mais graves ingerindo menor quantidade de sódio por orientação médica/nutricional;
·         Por se tratar de estudo observacional, deve-se levar em conta fatores confundidores residuais.

Pílula do Clube: Tanto a excreção aumentada de sódio (>7g/dia), quanto a excreção reduzida de potássio (<3g/dia) estão associadas a aumento de desfechos cardiovasculares.


Discutido no Clube de Revista de 19/09/2016.

A Novel and Practical Screening Tool for the Detection of Silent Myocardial Infarction in Patients With Type 2 Diabetes

Peter P. Swoboda, Adam K. McDiarmid, Bara Erhayiem, Philip Haaf, Ananth Kidambi, Graham J. Fent, Laura E. Dobson, Tarique A. Musa, Pankaj Garg, Graham R. Law, Mark T. Kearney, Julian H. Barth, Ramzi Ajjan, John P. Greenwood, and Sven Plein

J Clin Endocrinol Metab 2016, 101(9):3316-23.

Trata-se de estudo transversal objetivando avaliar a acurácia diagnóstica de diversos parâmetros comumente mensurados e escore de risco derivado destas variáveis, em pacientes com diabetes tipo 2 (DM2) para detectar infarto silencioso (IAMs) em comparação com ressonância magnética cardíaca (RMC). Cem pacientes assintomáticos com DM2 foram recrutados de 30 centros de atenção primária em West Yorkshire, Reino Unido. Foram excluídos os pacientes portadores de doença cardiovascular estabelecida, doença renal (taxa de filtração glomerular estimada <30), hipertensão não controlada, tratamento com insulina ou inibidores da conversão da angiotensina/bloqueadores do receptor da angiotensina (IECA/BRA). Todos os pacientes foram submetidos à ecocardiografia, eletrocardiograma, MAPA-24h e RMC (avaliados quanto à presença de isquemia silenciosa através do realce tardio pelo gadolíneo, RTG). As RMC foram interpretadas por dois profissionais experientes. Foram também avaliados dosados HbA1c, troponina T ultrassensível (hs-cTnT) e NT-proBNP. Análise por Receiver operating characteristic (ROC) foi utilizada para determinar a acurácia diagnóstica da idade, razão E/A, RTG e o NT-proBNP na detecção de IAMs. Modelos aninhados foram utilizados para estabelecer a melhor área sob a curva possível combinando as variáveis associadas com IAMs. A partir dos pontos de corte derivados da análise de Youden, as variáveis receberam uma classificação binária (0 ou 1) e foram somadas para calcular um escore de risco (variando de 0-4). Foi estimado que, assumindo uma prevalência de IAMs em torno de 10% e um poder de 80% (α=0,05) seriam necessários 98 pacientes, incluindo 10 com IAMs.
Dezessete dos 100 pacientes tiveram evidência de IAMs na RMC. Os pacientes tinham 60,7 ± 10,9 anos, duração do DM2 5,0 ± 4,4 anos e HbA1c 7,9% ± 1,79. Os pacientes com IAMs eram mais velhos, porém não houve diferença em qualquer outra característica ou uso de medicações. Ondas Q patológicas no ECG estavam presentes em apenas 4/17 pacientes com IAMs e em 6/63 sem IAMs (sensibilidade 24%, especificidade 93%). A única diferença significativa vista ao ecocardiograma foi uma razão E/A menor em pacientes com IAMs (0,75 ± 0,30 vs. 0,89 ± 0,30; P=0,03). Dos achados na RMC, o índice de massa do ventrículo esquerdo foi maior naqueles com IS (51,4 ± 6,5 vs. 47,2 ± 8,7 g/m²; P=0,01). Alguns outros parâmetros como a deformação longitudinal global (global longitudinal strain - GLS), a taxa de pico de deformação sistólica e a taxa de deformação diastólica precoce foram menores naqueles com IAMs. Os valores de NT-proBNP foram maiores naqueles com IAMs (105,8 ± 132,2 vs. 51,9 ± 100,8 ng/L, P=0,003). A área sob a curva (AUC) para o modelo aninhado das 4 variáveis (idade, razão E/A, GLS e NT-proBNP) foi 0,850 (0,765-0.914; P<0,0001), e a máxima sensibilidade possível foi 94% e especificidade 71%. O escore de risco com as 4 variáveis combinadas teve uma AUC de 0,823 (0,734-0,892; P <0,0001). Durante o clube foram discutidos os seguintes aspectos:
·         Os autores sugerem que as 4 variáveis que compõem o escore são geralmente medidas e que podem ser facilmente aferidas em rastreamentos populacionais, porém não são de fato variáveis comumente aferidas;
·         A escolha das 4 variáveis do escore descritas nos métodos foi feita por serem parâmetros “significativamente diferentes naqueles com IAMs”, fato que apenas poderia ser concluído após as análises terem sido concluídas;
·         A tabela 1 do estudo inclui entre as características o número de pacientes em uso de IECA/BRA e de insulina mesmo sendo estes achados critérios de exclusão;
·         Outra falha importante é o fato de os autores terem utilizado os parâmetros de GLS aferidos pela RMC sendo que o objetivo do estudo era criar um escore baseado em ecocardiografia, exame que foi realizado em todos os participantes;
·         Os autores não citam as várias evidências que desfavorecem o rastreamento de isquemia silenciosa em pacientes com DM2 por não haver redução de desfechos (DIAD, DYNAMIT e FACTOR 64). Ao contrário, na discussão é comentado que “o reconhecimento de IAMs nesses pacientes deve suscitar a modificação agressiva de fatores de risco, o que pode melhorar desfechos clínicos de longo prazo”. A validade externa, portanto, fica prejudicada;
·         Os pontos de corte do estudo não ficaram bem estabelecidos, visto que não há uma relação linear entre o aumento de pontuação (0-4) e o aumento da sensibilidade ou especificidade.

Pílula do Clube: Apesar do escore de risco desenvolvido pelos autores possuir sensibilidade e especificidade adequadas (a depender do ponto de corte utilizado) para predizer IAMs, não parece haver aplicabilidade prática do instrumento à luz das evidências atuais, que não favorecem o rastreamento de infarto silencioso nesses pacientes.

Discutido no Clube de Revista de 12/09/2016.

segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Timing of radioactive iodine administration does not influence outcomes in patients with differentiated thyroid carcinoma

Rafael Selbach Scheffel, André B. Zanella, José Miguel Dora, and Ana Luiza Maia.

Thyroid. September 2016, ahead of print. doi:10.1089/thy.2016.0038

            Trata-se de uma coorte retrospectiva com o objetivo de avaliar se o intervalo de tempo entre a tireoidectomia total (TT) e a radioiodoterapia (I131) em pacientes com carcinoma diferenciado de tireoide (CDT), atendidos consecutivamente em um centro de referência, no período de 2000 a 2015 tem impacto nos desfechos da doença. Foram incluídos 545 pacientes que receberam I131 e possuíam dados relacionados ao status da doença durante o seguimento. Destes, 322 (59,1%) foram considerados com estadiamento pelo sistema TNM com estágio I, 62 (11,4%) com estágio II, 65 (11,9%) com estágio III e 82 (15,0%) com estágio IV. Os pacientes foram divididos em dois grupos de acordo com o tempo entre a TT e o I131: <6 meses (Grupo A, n=295) ou >6 meses (Grupo B, n=250). Os grupos eram semelhantes para variáveis como sexo, tipo histológico, tamanho tumoral, presença de metástases a distância e dose do I131 (P>0,1). Pacientes no grupo B eram mais velhos (47,1 vs. 43,1 anos, P=0,02), tinham menos metástases cervicais (73,6 vs. 59,3%, P=0,002) e eram mais frequentemente classificados como baixo risco (48,0 vs. 36,6%, P=0,027). O intervalo entre a TT e o recebimento da dose de I131 dependia exclusivamente da disponibilidade no sistema de saúde. Após dose terapêutica do I131 e durante o seguimento, os pacientes eram classificados como: livres de doença, com doença persistente ou com doença recorrente.
Os resultados demonstraram que após 1 ano da terapia inicial, 59,3% e 65,6% dos pacientes dos grupos A e B respectivamente, foram considerados livres de doença (P=0,15). Os números foram similares mesmo quando analisados apenas os pacientes de alto risco (n=72, 9,5 vs. 10%, P=1,0). Os achados não se modificaram ao longo de 6 anos de seguimento, sem diferença também nas taxas de recorrência entre os grupos, 5,4% vs. 3% nos grupos A e B respectivamente (P=0,39). Análises por modelos de regressão logística demonstraram que o maior tempo para recebimento do I131 não esteve associado à doença persistente (RR 0,97; IC95% 0,80-1,19), mesmo após ajustes para as diferenças observadas nos dois grupos. Durante o Clube de Revista, os seguintes pontos foram discutidos:
·         Foi um estudo pragmático e representativo devido sua população ser composta de pacientes de baixo, médio e alto risco, além de representar o fluxo habitual dentro do sistema de saúde;
·         Por ser um estudo realizado em um único centro de referência, todos os pacientes receberam a mesma linha de cuidados, o que contribui para uniformidade dos tratamentos e seguimento;
·         Após dados apresentados, será possível tranquilizar pacientes e comunidade médica em geral que quando o I131 for indicado, poderá ser seguramente administrado em qualquer período dentro de 1 ano após a TT.

Pílula do Clube: O tempo entre a TT e a administração da dose de I131 não tem impacto em desfechos do CDT (resposta à terapia inicial, status da doença no seguimento e taxas de recorrência) independente de categoria de risco, podendo ser planejado de acordo com a disponibilidade do sistema de saúde.


Discutido no Clube de Revista de 05/09/2016.

Nomenclature Revision for Encapsulated Follicular Variant of Papillary Thyroid Carcinoma
A Paradigm Shift to Reduce Overtreatment of Indolent Tumors

Yuri E. Nikiforov, Raja R. Seethala, Giovanni Tallini, Zubair W. Baloch, Fulvio Basolo, Lester D. R. Thompson, Justine A. Barletta, Bruce M. Wenig, Abir Al Ghuzlan, Kennichi Kakudo, Thomas J. Giordano, Venancio A. Alves, Elham Khanafshar, Sylvia L. Asa, Adel K. El-Naggar, William E. Gooding, Steven P. Hodak, Ricardo V. Lloyd, Guy Maytal, Ozgur Mete, Marina N. Nikiforova, Vania Nosé, Mauro Papotti, David N. Poller, Peter M. Sadow, Arthur S. Tischler, R. Michael Tuttle, Kathryn B. Wall, Virginia A. LiVolsi, Gregory W. Randolph, Ronald A. Ghossein.

JAMA Oncol. April, 2016. doi:10.1001/jamaoncol.2016.0386

Trata-se de um projeto internacional para reavaliar a entidade carcinoma papilífero de tireoide variante folicular encapsulada (EFVPTC), envolvendo equipe médica multidisciplinar experiente na revisão e seguimento em longo prazo destes casos. Os objetivos eram redefinir os critérios diagnósticos e identificar a terminologia mais apropriada de acordo com as características clínicas e biológicas destas lesões. Foram avaliados, através de uma coorte retrospectiva, 268 casos de tumores diagnosticados com EFVPTC, sendo que, após exclusões, o grupo 1 era composto pelos EFVPTC não invasivos com 10 anos de seguimento (n=109) e o grupo 2 por aqueles com invasão vascular e/ou cápsula tumoral com pelo menos 1 ano de seguimento (n=101). As lâminas dos anatomopatológicos eram codificadas e digitalizadas em uma plataforma digital de acesso para todo grupo. Diversas conferências presenciais foram realizadas para estabelecimento de consenso nos critérios diagnósticos e desenvolvimento da nova nomenclatura.
 Foram avaliados desfechos como frequência de eventos adversos, incluindo morte pela doença, aparecimento de metastases (MTS) locorregionais ou à distância e recorrência estrutural ou bioquímica da doença. No grupo 1 (n= 109), 67 pacientes foram submetidos a lobectomia e nenhum utilizou 131I. Durante um seguimento de 10-26 anos, nenhum apresentou evidência de doença. No grupo 2 (n=101), 86 foram tratados com tireoidectomia total e destes, 85 receberam 131I. No seguimento (1-18 anos), 12 pacientes (12%) apresentaram eventos adversos: 5 MTS à distância (pulmão/osso), 2 invasões capsulares, 1 invasão vascular, 2 invasões vasculares e capsulares, 2  mortes secundárias à doença, 1 recorrência linfonodal, 1 persistência da doença e 5 respostas bioquímicas incompletas. A média de tamanho tumoral era de 3,1 (1,1 – 9 cm) e 2,5 (0,6 – 5,5 cm) nos grupos 1 e 2 respectivamente. 
                        Baseado nestas informações, a nomenclatura de “noninvasive follicular thyroid neoplasm with papillary-like nuclear features” (NIFTP) foi adotada. Os critérios anatomopatológicos utilizados para esta nova designação foram: cápsula claramente íntegra, padrão de crescimento folicular (<1% papilar, ausência de corpos psamomatosos e padrão de crescimento sólido/trabecular/insular), escore nuclear entre 2-3, ausência de invasão vascular, necrose tumoral ou alta atividade mitótica. Avaliação genética de parte da amostra não revelou diferenças entre os grupos. Um escore diagnóstico simplificado foi desenvolvido e validado, obtendo sensibilidade de 98,6% (IC95% 96,3%-99,4%), especificidade de 90,1% (IC95% 86,0%-93,1%), e acurácia de 94,3% (IC95% 92,1%-96,0%) para o diagnóstico de NIFTP. Durante o Clube de Revista, os seguintes pontos foram discutidos:
·       A reclassificação é um assunto de extrema importância, visto que apesar de conhecido comportamento indolente, o EFVPTC não invasivo segue sendo classificado como câncer e recebendo todas as terapias designadas às entidades mais agressivas de câncer de tireoide;
·       Maior prevalência de mutações do RAS foi associada à linhagem folicular de neoplasias tireoidianas, como adenoma folicular e carcinoma folicular de tireoide;
·       Equipes de patologia devem ser treinadas para avaliação acurada dos critérios diagnósticos, tornando reprodutível a correta identificação dos NIFTP;
·       Visto que a maioria dos pacientes com NIFTP realizaram apenas lobectomia, o manejo destes casos pode ser descalonado - não havendo benefícios de 131I ou tireoidectomia total.

Pílula do Clube: Lesões do tipo EFVPTC não invasivas representam uma classe de tumores tireoidianos de muito baixo risco para eventos adversos, devendo ser reclassificados como “Neoplasia folicular não invasiva com características nucleares tipo papilar (NIFTP)”.


Discutido no Clube de Revista de 29/08/2016.

The Association between Sulfonylurea Use and All-Cause and Cardiovascular Mortality: A Meta-Analysis with Trial Sequential Analysis of Randomized Clinical Trials

Rados DV, Pinto LC, Remonti LR, Leitão CB, Gross JL.

PLoS Med. 2016 Apr 2;13(4):e1001992.

Trata-se de uma revisão sistemática com metanálise de ECRs em pacientes com DM2 que utilizaram sulfoniluréia de 2° ou 3° geração, com duração de pelo menos 52 semanas, que reportaram morte por todas as causas, morte por causa cardiovascular, IAM ou AVC. Além da análise dos desfechos comparando usuários de sulfoniluréias e os grupos controle, foi realizado metanálise de cada grupo controle (placebo, dieta e comparadores ativos). Também foi avaliada utilização como monoterapia, terapia combinada ou inespecífica (sem descrição), e análise de cada fármaco da classe. Foi realizada TSA (trial sequential analysis) para os desfechos principais, objetivando avaliar se a amostra foi suficiente para firmar conclusões sobre os efeitos das intervenções, utilizando uma diferença esperada entre os grupos de 0,5% para estimar o tamanho ideal da amostra. Análises foram realizadas utilizando o método de Peto, pois este se ajusta melhor para estudos com eventos raros do que o Mantel-Haenszel. Para avaliar vieses de estudos pequenos, foi utilizado um contour-enhanced funnel plot e teste de Begg e Egger para assimetria. O método de trim-and-fill foi utilizado para estimar os efeitos dos estudos não incluídos.
Na análise final foram incluídos 47 estudos, com um total de 37.650 pacientes, com idade média de 57,3 anos e HbA1c média no baseline  de 7,2%. Não houve aumento de mortalidade por todas as causas ou cardiovascular associado ao uso de sulfoniluréia quando comparado a placebo, dieta ou comparadores ativos. Essa ausência de efeito se manteve quando analisados apenas estudos com seguimento maior do que 2 anos e após análises de vieses de publicação. Também não foi demonstrado aumento do risco de IAM ou AVC, mesmo após subanálises. Os resultados não modificaram quando foram avaliadas separadamente as intervenções do grupo controle ou a linha do tratamento (monoterapia, combinada ou 2° droga junto a metformina). Quando avaliado cada fármaco isoladamente, o uso da glipizida foi associado ao aumento do risco de mortalidade por causa cardiovascular e por todas as causas, baseados em pequeno número de pacientes e estudos. Utilizando o TSA, foi descartado uma diferença entre os grupos de 0,5% (NNH 200) em relação à morte por causa cardiovascular e por todas as causas. Para os pacientes que utilizaram tratamento combinado (MTF + Sulfa), com o TSA foi descartada diferença para morte por todas as causas, mas não por causa cardiovascular. Durante o Clube foram discutidos os seguintes aspectos
·         O aumento do risco de eventos relacionados com sulfoniluréias descrito em estudos anteriores parece estar relacionado com a inclusão das sulfoniluréias de 1° geração;
·         A análise com o TSA demonstrou que não são necessários mais estudos para comprovar estes achados.

Pílula do Clube: O uso de sulfoniluréias de segunda e terceira geração no tratamento de pacientes com DM2 não está relacionado ao aumento do risco de IAM, AVC, morte por causa cardiovascular ou por todas as causas.


Discutido no Clube de 22/08/2016.

Evaluation of the Effect of Diagnostic Molecular Testing on the Surgical Decision-Making Process for Patients with Thyroid Nodules

Salem I. Noureldine, Alireza Najafian, Patricia Aragon Han, Matthew T. Olson, Dane J. Genther, Eric B. Schneider, Jason D. Prescott, Nishant Agrawal, Aarti Mathur, Martha A. Zeiger, Ralph P. Tufano.

JAMA Otolaryngol Head Neck Surg 2016, 142(7):676-682

Trata-se de estudo prospectivo, com objetivo de avaliar mudança da conduta cirúrgica com uso de testes moleculares em nódulos de tireoide suspeitos. Foram incluídos todos os casos de tireoidectomia do Hospital Johns Hopkins de abril/2014 a março/2015. Foram incluídos pacientes que haviam realizado testes moleculares previamente (casos) e aqueles sem testes moleculares (controles). Foram excluídos pacientes com cirurgia de tireoide prévia. Foram utilizados os seguintes marcadores moleculares: gene expression classifier (Afirma; Veracyte Inc), DNA-based somatic mutation panel (SMP) (Asuragen [Asuragen Clinical Laboratory], ThyroSeq [CBLPath], Quest [Quest  Diagnostics]), BRAF (OMIM 164757) V600E mutation analysis with or without RAS or RET/PTC (OMIM 164761). Os pacientes eram vistos por um dos cinco cirurgiões do hospital e tinham o exame citopatológico do nódulo revisado e reclassificado conforme a classificação de Bethesda. Previamente ao início do estudo, foi elaborado um fluxograma para manejo dos nódulos tireoidianos, em comum acordo entre os cinco cirurgiões e os autores do estudo. Os dados e conduta adotada eram preenchidos durante a consulta em software desenvolvido para este fim. Quando a conduta era a esperada, conforme o fluxograma, o dado era armazenado. Quando divergia, o cirurgião justificava a conduta em um campo específico.
Durante um ano foram encaminhados 703 pacientes com nódulos de tireoide sem tratamento cirúrgico prévio. Destes, 15 pacientes foram excluídos por dados faltantes (resultado de punção aspirativa). Os 688 restantes (559 mulheres e 129 homens) foram incluídos, 55 provenientes do próprio hospital e outros 633 encaminhados por médico assistente externo. A análise com marcadores moleculares foi realizada em 140 pacientes (20,3%). Se o desvio de protocolo (mudança de conduta, divergente do fluxograma) fosse para conduta mais agressiva e o resultado histopatológico final maligno ou para conduta menos agressiva com resultado histopatológico final benigno, estas condutas foram consideradas como desvios de protocolo adequados. Qualquer outra combinação foi classificada como desvios de protocolo inadequado. A conduta cirúrgica adotada foi diferente do fluxograma em 12,9% (18 de 140) dos pacientes com teste molecular versus 10,2% (56 de 548) naqueles sem teste (P=0,37). Quando avaliados todos os pacientes que realizaram testes moleculares, 50,7% dos testes foram em nódulos sem indicação para este exame; nestes casos quando o resultado dos testes alterou a conduta, todos os pacientes foram hipertratados. Nenhum teste molecular demonstrou valor preditivo negativo e/ou valor preditivo positivo suficiente para ser usado como único teste diagnóstico. Durante o clube foram discutidos os seguintes aspectos:
·         O estudo apresenta um possível viés de seleção, uma vez que os nódulos encaminhados para um centro maior (como Hospital Johns Hopkins) podem representar uma população com maior risco para malignidade;
·         A elaboração de um algoritmo próprio, sem validação prévia, pode diminuir a validade externa do estudo;
·         Os valores preditivos (negativo e positivo) variam conforme a população (dependem da prevalência) e podem afetar a confiança do médico no teste, alterando a conduta quanto à indicação e extensão do procedimento cirúrgico;
·         Nódulos de tireoide muitas vezes podem ser observados clinicamente, pois têm comportamento em geral indolente. O uso de marcadores moleculares, na maioria das situações, não implica em mudança de desfechos clínicos;
·         O uso de marcardores moleculares nesse estudo não foi adequado, visto que 50,7% dos testes tiveram indicação classificada como inapropriada pelos pesquisadores.
Pílula do clube: O uso de marcadores moleculares não alterou a conduta cirúrgica em nódulos de tireoide e o seu uso indiscriminado pode levar a sobretratamento (overtreatment). O potencial benefício em desfechos clínicos da utilização de marcadores moleculares em nódulos com PAAF não-diagnóstica (indeterminada/insuficiente) permanece por ser estudado.


Discutido no Clube de Revista de 15/08/2016.

Effects on Health Outcomes of a Mediterranean Diet with no Restriction of Fat Intake: A Systematic Review and Meta-analysis

Hanna E. Bloomfield, Eva Koeller, Nancy Greer, Roderick MacDonald, Robert Kane, Timothy J. Wilt

Annals of Internal Medicine 2016, [Epub ahead of print].

Trata-se de revisão sistemática cuja hipótese operacional era avaliar se pessoas saudáveis ou com doenças crônicas que seguem uma dieta mediterrânea ou qualquer outra dieta apresentam risco de morte ou de surgimento/piora de doença crônica igual a 1.  Para isso, foi feita uma revisão sistemática de ensaios clínicos randomizados (ECR), estudos clínicos controlados ou estudos de coorte publicados de 1990 até abril/2016 comparando dieta mediterrânea (sem restrição no consumo total de gordura) com qualquer outra dieta. A descrição da dieta mediterrânea variou conforme o tipo de estudo avaliado: 1) RCTs - definição de dieta mediterrânea incluía consumo irrestrito de gorduras e dois ou mais dos seguintes componentes: alta relação gordura monoinsaturada/saturada (uso de óleo de oliva como principal ingrediente); alto consumo de frutas, verduras, legumes, cereais e grãos integrais; moderado consumo de vinho tinto; moderado consumo de laticínios, baixo consumo de carne e derivados com aumento no consumo de peixe. 2) Estudos observacionais – 2 ou mais dos fatores acima, sem descrição especifica em relação a quantidade de gordura da dieta. Nestes estudos os resultados foram baseados em questionários de frequência alimentar. Os desfechos avaliados foram mortalidade total, hipertensão (HAS), diabetes (DM), doença cardiovascular (DCV), câncer, déficit cognitivo, artrite reumatoide, doença renal e qualidade de vida, todos eles em contexto de prevenção primária e de prevenção secundária. Outro desfecho a ser avaliado era aderência à dieta mediterrânea em uma população norte americana. Para os desfechos DCV, HAS, mortalidade total ou DM foram avaliados apenas ECR ou estudos clínicos controlados com no mínimo 100 pacientes e seguimento de pelo menos 1 ano; para avaliar aderência à dieta, os estudos deveriam ter sido conduzidos nos Estados Unidos ou Canadá e ter relato de adesão à dieta como desfecho; para câncer e qualidade de vida, foram também incluídos estudos de coorte com as mesmas características de pacientes e seguimento; e para artrite reumatoide e déficit cognitivo, foram avaliados ECR, estudos clínicos controlados ou estudos de coorte com qualquer número de pacientes e sem tempo de seguimento mínimo. Os estudos de coorte deveriam relatar questionário alimentar (auto relatado ou feito pela equipe), utilizado para categorizar a dieta dos participantes em quartis de aderência a uma dieta mediterrânea. Dois autores avaliaram de forma independente os estudos segundo sua elegibilidade, risco de vieses e extração dos dados, com as discordâncias sendo decididas por consenso.
Foram identificados 10.349 estudos, e incluídos 56 na revisão sistemática; desses, 44 eram de prevenção primária, 12 de prevenção secundária e nenhum para avaliação de aderência. Na revisão sistemática de ECR de prevenção primária, dieta mediterrânea se associou com redução de 29% em DCV (sem efeito na mortalidade total) (dois estudos); menor incidência de DM2 (um estudo). Foi realizada metanálise de 16 estudos de coorte com avaliação de câncer como desfecho em prevenção primária, que mostrou que o quartil com maior aderência à dieta mediterrânea se associou com redução de 14% na mortalidade por câncer (RR 0,86 IC95% 0,82-0,91), 4% na incidência total de câncer e 9% na incidência de câncer colorretal, além de se associar com menor incidência de câncer de pulmão, sem diferença na incidência de câncer de mama. Em prevenção primária, a força da evidência para mortalidade, incidência de câncer total, incidência de câncer de mama e colorretal, e déficit cognitivo foi considerada baixa. Na revisão sistemática dos artigos de prevenção secundária, a força da evidência para mortalidade total foi considerada insuficiente. Houve resultados mistos para DCV, morte CV, mortalidade total, recorrência e mortalidade por câncer. Foi considerada evidência mínima, inconsistente ou nenhuma evidência de associação para todos os outros desfechos (HAS, doença renal, artrite reumatoide, déficit cognitivo e qualidade de vida) tanto em prevenção primária como em secundária. Nenhum estudo preencheu os critérios para avaliação de aderência à dieta mediterrânea na população norte-americana. Pontos discutidos durante o clube:
·         Os resultados deste estudo são diferentes de revisão da Cochrane de 2013 (52.044 participantes, 11 estudos), que teve uma definição diferente de dieta mediterrânea (restrição da ingesta de gordura) e dieta controle com mínima intervenção. Não houve estudos semelhantes nas dois revisões; esta revisão incluiu como principal estudo o PREDIMED (controle: dieta pobre em gordura), e a outra, o Women’s Health Initiative-Dietary Modification - WHI-DM (intervenção: dieta mediterrânea pobre em gordura);
·         Foram limitações deste estudo: publicações apenas em inglês, uso do modelo de efeito aleatório de DerSimonian e Laird (pode produzir estimativas erroneamente mais altas se houver poucos estudos para metanalisar ou se as estimativas variarem muito entre os estudos), viés de publicação e de relato dos resultados, poucos ECR e metade dos estudos de coorte com viés médio.
·         A dieta usada como comparador poderia ser uma dieta já com conhecidos efeitos benéficos sobre DCV, DM, câncer e mortalidade e por isso os efeitos da dieta mediterrânea não ficaram tão evidentes.
·         Houve inclusão de poucos estudos em cada um dos desfechos. Meta-análise foi realizada apenas para prevenção primária de mortalidade por câncer.

Pílula do clube: esta revisão sistemática demonstrou que a dieta mediterrânea está relacionada com diminuição de DCV, DM e alguns tipos de câncer. É importante ressaltar que os resultados de estudos deste tipo de intervenção são potencialmente influenciáveis pela definição da dieta em estudo e pelos seus comparadores.


Discutido no Clube de Revista de 08/08/2016.

Adrenal vein sampling versus CT scan to determine treatment in primary aldosteronism: an outcome-based randomised diagnostic trial

Tanja Dekkers, Aleksander Prejbisz, Leo J Schultze Kool, Hans J M M Groenewoud, Marieke Velema, Wilko Spiering, Sylwia Kołodziejczyk-Kruk, Mark Arntz, Jacek Kądziela, Johannes F Langenhuijsen, Michiel N Kerstens, Anton H van den Meiracker, Bert-Jan van den Born, Fred C G J Sweep, Ad R M M Hermus, Andrzej Januszewicz, Alike F Ligthart-Naber, Peter Makai, Gert-Jan van der Wilt, Jacques W M Lenders, Jaap Deinum, for the SPARTACUS Investigators.

Lancet Diabetes Endocrinol. 2016 Sep;4(9):739-46. 

Trata-se de ensaio clinico randomizado, multicêntrico, controlado e aberto com o objetivo de comparar o manejo dos pacientes com hiperaldosteronismo primário (HAP) com base nos achados diagnósticos da tomografia computadorizada (TC) vs. cateterismo de veias adrenais (CVA). Foram incluídos pacientes com idade ≥ 18 anos e hipertensão necessitando  mais do que 3 drogas, ou hipertensão acompanhada por hipocalemia. Critérios de exclusão eram recusa do paciente a ser submetido à TC, CVA ou adrenalectomia, gestação, suspeita de HAP remediável por glicocorticoides, suspeita de carcinoma adrenocortical, comorbidade grave potencialmente interferindo com o tratamento ou com a qualidade de vida ou necessidade de medicamentos que interferissem com o protocolo do estudo. Todos os pacientes foram submetidos à MAPA de 24h e avaliada qualidade de vida (questionário RAND-36).
Os pacientes randomizados ao grupo da TC eram tratados com adrenalectomia em caso de uma adrenal aumentada unilateralmente. Em casos de adrenais bilateralmente normais ou aumentadas, os pacientes recebiam antagonistas do receptor de mineralocorticoide (ARM). Os pacientes randomizados ao CVA realizavam antes uma TC para determinação da anatomia das veias adrenais. O CVA era realizado sob estimulação contínua com cosintropina e cateterização sequencial das veias adrenais. Os pacientes com doença unilateral eram tratados com adrenalectomia, e os demais com ARM. Nos pacientes com CVA bem-sucedido, a TC realizada previamente não teve efeito nas decisões de tratamento. No caso de falha do procedimento, os pacientes eram tratados com base na TC, mas eram analisados no grupo do CVA.
Após a adrenalectomia a medicação anti-hipertensiva era ajustada pelo médico assistente com objetivo de atingir alvo pré-determinado. Na avaliação final após 1 ano, outra MAPA era realizada e os pacientes adrenalectomizados eram novamente submetidos ao teste de sobrecarga salina. O desfecho primário foi a intensidade de medicação anti-hipertensiva necessária, expressa em doses diárias definidas (DDD). A proporção de pacientes atingindo a pressão arterial alvo foi incluída como desfecho secundário. Outros desfechos secundários incluíram potássio e aldosterona após teste de sobrecarga salina nos adrenalectomizados. Qualidade de vida (RAND-36), efeitos adversos e custo-efetividade do tratamento também foram avaliados.
Foram incluídos na análise 92 pacientes no grupo TC e 92 no grupo CVA. No grupo da TC, 12% apresentaram aumento unilateral direito, 40% aumento unilateral esquerdo, 22% aumento bilateral e 26% apresentaram adrenais bilateralmente normais. O CVA foi bem-sucedido em 96% dos procedimentos. Desses, 22 procedimentos apresentaram lateralização para a direita e 26 para a esquerda. Nos 4 procedimentos que falharam a TC identificou doença unilateral em 2 pacientes e doença bilateral nos outros 2. Dos 90 pacientes com ambas TC e CVA conclusivas, 50% tiveram resultados discordantes. Adrenalectomia foi realizada em 50 pacientes no grupo do CVA e em 49 pacientes no grupo da TC.  Para o desfecho primário, não houve diferença no uso de medicação entre os dois grupos [dose definida diária mediana 3,0 (IIQ 1,0-5,0) na TC versus 3,0 (IIQ 1,1-5,9) no CVA, P=0,52]. A pressão arterial média e o número de pacientes atingindo a meta também foram similares. O potássio não diferiu entre os dois grupos. Nos pacientes operados, 61% apresentaram supressão da aldosterona no teste de sobrecarga salina, 27% apresentaram resultados indeterminados e 11% não suprimiram. Após a avaliação final, 15% mantinham HAP persistente, sem diferença no número de pacientes detectados por TC ou CVA. Não houve diferença na qualidade de vida. Não houve diferença no número de eventos adversos. Os desfechos foram semelhantes independentemente da faixa etária. Durante o clube foram discutidos os seguintes aspectos:
·         A taxa de sucesso do procedimento de CVA (96%) foi inesperadamente alta, o que limita os achados em termos de validade, pois centros com menor experiência provavelmente não terão taxas semelhantes;
·         A predominância de doença unilateral na adrenal esquerda no grupo da TC não parece ter plausibilidade biológica aceitável;
·         A discordância dos resultados em 50% dos pacientes com ambos CVA e TC conclusivos demonstra que talvez exames diferentes selecionem pacientes diferentes;
·         Os autores deveriam ter submetido os pacientes ao rastreamento de Cushing subclínico;
·         A curta duração do estudo não permite avaliar desfechos importantes como morbimortalidade cardiovascular e recorrência do HAP;

Pílula do Clube: A intensidade do tratamento medicamentoso do HAP tratado com base na TC ou no CVA não parece ser diferente neste grupo de pacientes com curta duração de acompanhamento.

Discutido no Clube de 01/08/2016.

quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Diabetes treatments and risk of heart failure, cardiovascular disease, and all cause mortality: cohort study in primary care

Julia Hippisley-Cox, Carol Coupland

BMJ 2016, 354; i3477

            Trata-se de coorte populacional de pacientes da Inglaterra entre 25 e 84 anos com diagnóstico de DM2. O objetivo foi avaliar associação entre risco de doença cardiovascular (DCV), insuficiência cardíaca (IC) e mortalidade por qualquer causa com os diferentes tipos de medicações para DM, em especial gliptinas e glitazonas. Foram coletados dados de 2007-2015 disponíveis no banco de dados QResearch, de 1.245 centros primários (24 milhões de pacientes) da região. Para ser incluído no estudo, o paciente necessitava ter DM2 ou mais de uma prescrição de algum antidiabético. Eram excluídos pacientes com DM1 (uso de insulina e < 35 anos de idade). Os desfechos primários foram diagnóstico de DCV, IC e mortalidade por todas as causas. Foi utilizado modelo Cox proporcional para estimar HR para os diferentes tratamentos, ajustando para potenciais confundidores. O estudo foi dividido em períodos de tratamento (monoterapia ou multiterapia); os tratamentos foram divididos em seis grupos: glitazonas, gliptinas, metformina, sulfonilureias, insulina e outras.
No total, 274.324 (58,4%) dos pacientes receberam prescrição de um ou mais fármacos para DM2: 21.308 (4,5%) glitazonas, 32.533 (6,9%) gliptinas, 256.024 (54,5%) metformina, 134.570 (28,7%) sulfonilureas, 19.791 (4,2%) insulina, 12.062 (2,6%) outros medicamentos. Em relação ao não uso do fármaco, as gliptinas estiveram associadas à redução de 18% do risco de mortalidade por todas as causas e 14% de redução de IC. As glitazonas se associaram com redução de mortalidade em 23%, IC em 26% e DCV em 25%. Tratamento combinado com gliptinas e metformina esteve associado à redução dos três desfechos (48%, 38% e 33% respectivamente). Tratamento triplo com metformina, sulfoniluréias e gliptinas ou glitazonas também esteve associado com redução dos três desfechos. Mesmo a monoterapia com glitazonas esteve associada à diminuição de risco de 50% de IC. Foi encontrada interação das glitazonas e gliptinas com a idade e Hba1c para mortalidade do paciente: efeito foi menor quanto maior a HbA1c e idade. Houve também interação de glitazonas e gliptinas com HbA1c para DCV: efeito foi menor quanto maior a HbA1c. Durante o clube de revista foram discutidos os seguintes pontos:
·        Apesar de não se tratar de um ECR e, por isso apresentar limitações inerentes aos estudos observacionais, estes dados nos permitem uma avaliação do risco de IC e doença cardiovascular em pacientes em uso de medicações “clássicas para o DM”, (metformina, sulfoniluréias e insulina), e nos permitem compará-las de forma indireta com as novas classes gliptinas e glitazonas;
·        O fato de não ter se encontrado associação do uso de glitazonas com risco de IC pode se dever a viés de seleção desses pacientes (selecionados para uso somente pacientes com baixo risco para desenvolvimento de IC);
·        O estudo não faz distinção entre as diferentes gliptinas, sendo que alguns trabalhos prévios mostram diferentes riscos de problemas cardiovasculares com diferentes medicamentos da mesma classe;
·        Não se sabe se o efeito deletério demonstrado em relação ao uso de insulina se deve ao fato do uso da medicação em si ou da seleção de pacientes mais graves para uso desta medicação.

Pílula do Clube: este estudo, com dados observacionais, demonstrou benefício do uso de gliptinas, glitazonas e metformina sobre desfechos cardiovasculares. As limitações inerentes ao seu delineamento e a falta de informações sobre aderência e dosagem dos medicamentos devem ser levados em conta na aplicação clínica desses dados.


Discutido no Clube de Revista de 25/07/2016.

Semaglutide and Cardiovascular Outcomes in Obesity without Diabetes

  A. Michael Lincoff, Kirstine Brown‐Frandsen, Helen M. Colhoun, John Deanfield, Scott S. Emerson, Sille Esbjerg, Søren Hardt‐Lindberg, G. K...