Steven P. Marso, Darren K. McGuire, Bernard Zinman, Neil
R. Poulter, Scott S. Emerson, Thomas R. Pieber, Richard E. Pratley, Poul-Martin
Haahr, Martin Lange, Kirstine Brown-Frandsen, Alan Moses, Simon Skibsted, Kajsa
Kvist, and John B. Buse, for the DEVOTE Study Group*
N Engl J Med 2017; 377:723-732
Trata-se de ensaio clínico
randomizado, duplo-cego, com comparador ativo, multicêntrico, de
não-inferioridade, realizado em 438 centros, com objetivo de avaliar a
segurança cardiovascular da insulina degludeca comparada com glargina U100 em
pacientes com alto risco cardiovascular. Foram incluídos
pacientes com DM tipo 2 em tratamento com pelo menos um agente oral ou
injetável, HbA1c ≥7% ou <7% em uso de pelo menos 20 UI de insulina basal e com
alto risco cardiovascular (≥50 anos e doença cardiovascular e/ou renal
estabelecida ou ≥60 anos e pelo menos um fator de risco para doença
cardiovascular - microalbuminúria ou proteinúria, hipertensão com hipertrofia
ventricular, disfunção sistólica e diastólica do ventrículo esquerdo e índice
tornozelo/braço <0,9). Eram critérios de exclusão: evento cardio ou
cerebrovascular nos últimos 60 dias, revascularização cardíaca, cerebral ou periférica
planejada, insuficiência cardíaca classe IV, diálise ou taxa de filtração
glomerular <30ml/min/1,73m² ou insuficiência hepática.
O
desfecho primário era a ocorrência de morte cardiovascular, infarto não-fatal
ou AVC não-fatal. Eram desfechos secundários a taxa e a incidência de
hipoglicemia grave. Foram randomizados 7.637 pacientes para receber degludeca +
terapia padrão vs. glargina U100 +
terapia padrão. Finalizaram o estudo 98% dos pacientes. O tempo médio de
observação foi de 1,99 anos, e o tempo de exposição foi de 1,83 anos. A idade
média dos pacientes era 65 anos, a duração do DM era em média 16,4 anos e a
HbA1c média era 8,4±1,7%. O desfecho primário ocorreu em 8,5% no grupo
degludeca versus 9,3% no grupo da glargina (HR 0,91, IC95% 0,78-1,06; P<0,001
para não-inferioridade). O desfecho primário acrescido do desfecho de morte
cardiovascular também foi não inferior no grupo intervenção. As análises de
subgrupo mostraram que o desfecho continuou sendo não-inferior em ambos os
sexos, estratos de idade, peso, função renal, duração do DM, risco
cardiovascular e de terapias prévias. Houve, entretanto, melhora nos desfechos
a favor do grupo degludeca na África e na Ásia. Houve 752 eventos de
hipoglicemia grave confirmados. Houve uma redução de 27% na incidência de
hipoglicemias graves no grupo degludeca em relação ao grupo glargina (OR 0,73,
IC95% 0,6-0,89, P<0,001 para superioridade). Também houve redução de 40% na
taxa de hipoglicemias graves (Rate ratio 0,60, IC95% 0,48-0,76, P<0,001 para
superioridade). A taxa de hipoglicemias noturnas graves reduziu em 53% (Rate
ratio 0,47, IC95% 0,31-0,73, P<0,001 para superioridade). A HbA1c média, ao
final de 24 meses, foi de 7,5% nos dois grupos. Houve uma diferença na glicemia
de jejum ao final do estudo de -7,2 mg/dl no grupo degludeca (IC95% -10,3 a
-4,1, P<0,001 na análise post-hoc).
Não houve diferença no peso, IMC, pressão arterial, frequência cardíaca, função
renal e perfil lipídico. Os efeitos adversos foram semelhantes entre os dois
grupos. Durante o clube foram discutidos os seguintes aspectos:
·
Chama
atenção o fato de microalbuminúria ter sido utilizada como critério de inclusão
tão potente quanto outros fatores de risco cardiovascular mais bem
estabelecidos – não é aceitável na composiçào de desfechos compostos esse
desequilíbrio;
·
O
estudo foi o primeiro, entre os estudos avaliando segurança cardiovascular, a
atingir controle glicêmico similar. As diferenças eventuais que pudessem surgir
entre os tratamentos, portanto, poderiam ser atribuidas mais fortemente ao
medicamento de intervenção;
·
A
taxa de perdas do estudo foi muito baixa. O fato de serem pacientes em sua
maioria já usuários de esquema basal-bolus de insulina pode representar
indivíduos com maior necessidade de visitas frequentes ao atendimento de saúde,
o que pode ter contribuído para a forte aderência às intervenções;
·
Os
efeitos tão diferentes na Ásia e na África levanta a hipótese de alguma
violação de protocolo ou diferenças importantes no cuidado desses pacientes, o
que pode comprometer a validade externa do estudo;
·
Mesmo
com redução significativa dos eventos de hipoglicemia grave no grupo degludeca,
não houve maior número de eventos cardiovasculares no grupo glargina, talvez
sugerindo que nessa população específica o papel da hipoglicemia no aumento de
mortalidade visto em estudos anteriores possa ser menos influente.
Pílula do clube: em pacientes com DM tipo 2 e alto
risco para doença cardiovascular, o uso de insulina degludeca foi não-inferior
ao uso de insulina glargina em termos de segurança cardiovascular. Houve maior
redução de hipoglicemias com a insulina degludeca, podendo esta ser melhor opção
em pacientes com DM tipo 2 em uso de esquema basal-bolus que tenham muitas
hipoglicemias.
Discutido no Clube de Revista de
10/07/2017.